Instituto de Cinema de SP

Democracia em Vertigem no Oscar

O documentário Democracia em Vertigem, dirigido por Petra Costa e lançado pela Netflix em meados do ano passado, foi indicado ao prêmio de Melhor Documentário no Oscar 2020.


Em um momento de desmonte de políticas públicas para a cultura, ataques claros do governo ao cinema nacional, em que o próprio presidente questiona “Há quanto tempo a gente não faz um bom filme no país?”, ameaçando inclusive zerar a Cota de Tela (regra que garante espaço para filmes nacionais nos cinemas brasileiros, protegendo o mercado da ocupação predatória por filmes estrangeiros), um filme nacional que questiona a própria legitimidade deste governo é reconhecido internacionalmente na mais aclamada premiação do cinema.


Democracia em Vertigem mostra o processo de impeachment de Dilma Rousseff e a crise política instaurada no Brasil, caracterizada por uma extrema polarização política e ideológica, retratada no filme e confirmada pela sua recepção pelo público. De maneira assumidamente parcial, Petra Costa faz uma análise do processo que destituiu a ex-presidenta, e também da própria constituição da democracia brasileira, melancolicamente indagando se a mesma não teria sido apenas “um sonho efêmero”, dada a sua história e fragilidade no tempo atual.


Adotando uma perspectiva subjetiva, com uma narração em primeira pessoa constante e o resgate da história de sua família, a diretora consegue construir uma ponte entre o público e o privado. A narrativa mescla sua memória individual à memória social com imagens de arquivo e gravações autorais que remontam à campanha das Diretas Já até o golpe de 2016, sendo a frustração pessoal provocada pela crise democrática atual a tônica do filme. Sem esconder seu posicionamento, a obra conta inclusive com imagens de Jair Bolsonaro como um político que se aproveitou do impeachment para alcançar notoriedade.


Após o anúncio dos filmes indicados ao Oscar, Petra usou as redes sociais para celebrar a indicação de Democracia em Vertigem afirmando: 


“Estamos absolutamente emocionados e extasiados por nossos colegas terem reconhecido a urgência deste filme, e honrados por estarmos na companhia de documentários tão importantes. Numa época em que a extrema direita está se espalhando como uma epidemia, esperamos que esse filme possa nos ajudar a entender como é crucial proteger nossas democracias. Está se tornando cada vez mais evidente o quanto o pessoal é político para tantos ao redor do mundo, e acredito que é por meio de histórias, linguagem e documentários que as civilizações começam a se curar."


Além da indicação ao Oscar, o documentário já havia sido reconhecido internacionalmente por críticos e festivais. O New York Times, por exemplo, o colocou na lista de dez melhores filmes do primeiro semestre de 2019, ressaltando a relevância da obra. Este reconhecimento recebido pelo filme ao redor do mundo reflete a importância de se discutir o cenário político atual. 


O filme fomenta o debate sobre a democracia brasileira, e agora coloca esse debate diante dos olhos do mundo inteiro, na mais importante premiação cinematográfica internacional. O cinema proporciona uma proximidade do público com o tema retratado que só pode ser atingida pela arte. Fala ao íntimo do espectador e provoca emoções. É mérito de Democracia em Vertigem sua força de levar adiante, em escala global, a realidade  que ofusca nossa democracia.


Wagner Moura, diretor de Marighella, filme que, segundo ele, vem sofrendo censuras do governo, afirmou: “A história comprova que a arte e o pensamento crítico são as primeiras vítimas desse tipo de governo”. Sendo assim, fica evidente a necessidade de se continuar o debate, apoiar e produzir arte, multiplicar discursos e histórias, e defender a nossa democracia. 


 


Por Isabella Thebas

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